Produção de algodão é retomada no RN

Conhecido pela alcunha de “ouro branco”, a produção de , produto que é símbolo da história da economia do Rio Grande do Norte, está retornando à cena. Com novas técnicas de cultivo e através de parcerias que garantem a venda de toda a produção, o branco das plumas voltou a fazer parte das plantações pelo Seridó através dos projetos “Algodão Agroecológico Potiguar” e “”.

plantio de algodão

Com as duas iniciativas, o Estado produziu neste ano 280 toneladas de algodão, movimentando cerca de R$ 1,5 milhão. São mais de 500 hectares de terra utilizados por 415 agricultores.

Os números ainda são tímidos em relação ao que era produzido no Estado até a década de 1980, mas trazem boas expectativas. O – executado pelo Governo do Estado, por meio da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Rural e Agricultura Familiar () e Instituto de Assistência Técnica e Extensão Rural (-RN) é que abrange maior parte desses números.

Esse projeto foi lançado em dezembro de 2021, num processo de mobilização e articulação que envolve a ONG , a rede Xique-Xique e o . Nessa iniciativa, estão envolvidos 361 agricultores que produziram cerca de 250 toneladas de algodão. “Temos uma média de 600 kg por hectare em 33 municípios. Os agricultores produziram cerca de 97.300 kg de pluma a um preço médio de R$ 14 o quilo. Isso resultou numa receita aproximada de R$ 1.372.200”, explicou o diretor-geral da Emater/RN, César Oliveira.

A pluma é o algodão sem caroço. De cada trê quilos do algodão completo, é retirado um quilo de pluma. O caroço é usado para alimentar os animais e é característico pelo alto teor de proteína. Já a pluma é adquirida pela ONG Diaconia, pela rede Xique-Xique e pelo Instituto Casaca de Couro que é uma ONG da Paraíba.

O algodão que comprados é fiado pela empresa de fiação e depois o fio é colocado no mercado, vai para as tecelagens que produzem os tecidos e as fábricas têxteis adquirem, segundo a direção da ONG. A expectativa, de acordo com a entidade, é de receber 150 toneladas da pluma do algodão potiguar.

O outro projeto que está retomando a produção de algodão é o AgroSertão, executado em seis municípios numa parceria entre o Sebrae no Rio Grande do Norte, o , a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária ( Algodão) e as Prefeituras dos municípios atendidos. É um projeto piloto de produção do algodão agroecológico iniciado neste ano com 54 produtores oriundos da agricultura familiar.

“A gente já está na fase final dessa primeira etapa. Nós trabalhamos com 54 agricultores e nós temos uma projeção de chegarmos a 30 toneladas da pluma. Se considerar a produtividade do algodão, gerou em torno de R$ 4 mil por agricultor. Para o primeiro ciclo tivemos um resultado formidável”, conta a gestora do projeto, Sergina Dantas, analista técnica do Sebrae/RN.

Todo o algodão produzido é comercializado pelo Instituto Riachuelo que teve a iniciativa de construir o projeto com a Embrapa. “O algodão é processamento para extrair a pluma, que é destinada à comercialização pelo Instituto Riachuelo e uma empresa de fiação na Paraíba para que se tornem confecção posteriormente pela Guararapes. Há planos da Guararapes criar uma coleção específica com esse produto do algodão”, disse Sergina Dantas.

Cultivo consorciado da produção de algodão

Nessa fase retomada da produção algodoeira potiguar, a plantação é feita com outras culturas como feijão, milho e gergelim, que são utilizados para consumo dos próprios agricultores, em suas outras atividades ou comercializados.

“A gente estima que, com o cultivo no consórcio alimentar, que entra o milho e feijão, a receita gira em torno de R$ 800 mil, fora o algodão. Por isso que a gente afirma que esse projeto resultou numa receita bruta de R$ 2,2 milhões. Se a gente for distribuir essa receita por agricultor, dá em média de R$ 6 mil por agricultor participante”, calcula o diretor da Emater/RN, César Oliveira.

Isso acontece dentro da política de segurança alimentar, além da percepção de não se cultivar o algodão de forma isolada para evitar a infestação de pragas e também de modo que ofereça mais opção de renda para os agricultores. Com isso, eles não trabalham apenas a produção do algodão, mas sim a propriedade como um todo.

“A gente tem várias outras ações diretas e indiretas que proporcionam a fonte de renda muito maior, como por exemplo, o caroço do algodão, a rama que também serve de forragem para esses animais, o próprio piolho do caroço também serve para ser utilizada na alimentação dos animais”, explica Sergina Dantas, gestora do projeto AgroSertão.

Em 2023, produção de algodão no Estado pode superar as 700 toneladas

Para o próximo ano os projetos agroecológicos que estão promovendo a retomada da produção de algodão no Rio Grande do Norte devem ser ampliados, chegando a mais municípios, ocupando mais hectares e beneficiando mais agricultores. Se os planos se concretizarem, a produção deve aumentar das 250 toneladas para quase 800, considerando as duas iniciativas.

“Nós vamos passar de 50 para 80 agricultores. Para o segundo semestre de 2023 é que a gente vai analisar a possibilidade de entrada de outros municípios e o aumento desse atendimento aos produtores”, declarou a gestora do projeto AgroSertão, Sergina Dantas.

A expectativa com o projeto que tem a parceria da Embrapa e do Instituto Riachuelo é de que, a iniciativa poossa atender a mais de 100 produtores, ampliando a quantidade de hectares para igual número.

Já no Projeto Algodão Agroecológico Potiguar, do Governo do Estado, o diretor-geral da Emater, César Oliveira, diz que deve partir dos 361 famílias para 700. “A gente estima que chegaremos a mil hectares. Queremos ampliar de 33 para 50 municípios. Se a gente chegar a produzir 700 kg de algodão em caroço por hectare, nós estamos falando em 700 toneladas”, prevê.

Isso deve resultar em 245 toneladas de pluma que podem gerar R$ 3,9 milhões. Considerando as outras culturas, como o feijão, o milho e também o caroço do algodão, César faz projeções ainda mais ambiciosas. “Nós temos expectativas que no ano de 2023 o projeto Algodão Agroecológico Potiguar vai permitir mobilizar 700 famílias, cultivando em mil hectares, e gerando uma receita estimada de R$ 5,2 milhões. Isso equivale a uma receita média por família de R$ 7.442,00, ou seja, uma receita média por família de 5,7 salários mínimos se a gente considerar o salário mínimo de 2023 que vai ser de R$ 1.302”, calcula.

Porém, ainda não se pode falar numa produção que se iguale ao que se viu até 30 anos atrás. “O que nós estamos dizendo não é necessariamente chegarmos a 500 mil hectares como foi um dia. A gente vai dando passos progressivos sem perder essa idéia de totalidade, sem perder essa perspectiva de que estamos no semi-árido e que algodão é um dos produtos dentro do sistema agroalimentar dos agricultores”, pondera o diretor da Emater.

Os projetos trazem uma dinâmica diferente, que passa por assistência técnica oferecida pela Embrapa/Sebrae ou pela Emater/RN. Os agricultores aprendes as técnicas de manejo e cultivo da semente desenvolvida para ser mais resistente à estiagem. Além disso, também aprendem a produzir e utilizar biofertilizantes e a manejar outras culturas agrícolas.

“A gente tem aí um avanço de quatro décadas, onde a inovação em tecnologia foi muito estudada e foi muito aperfeiçoada. Então, além de práticas agrícolas, melhoramento de sementes, melhoramento de técnicas também de manejo fizeram com que a gente identificasse os problemas e trabalhasse as soluções”, explica Sergina.

Para evitar a proliferação do besouro bicudo, que ajudou a dizimar a produção na década de 1980, uma combinação de fatores é aplicada. “Se o Bicudo é característico de onde há predomínio de monoculturas, a gente evita o cultivo isolado do algodão. Outro aspecto fundamental é o ciclo do cultivo. O algodão cultivado no Rio Grande do Norte até a década de 80 eram algodão arbóreo ou algodão mocó, de ciclo longo de até seis anos com condições favoráveis para o Bicudo. Já neste cultivo que temos hoje, a gente são quatro meses e ao final toda a produção precisa ser exterminada e plantada no ano seguinte”, explica César Oliveira.

Agricultores vivem recomeço e relembram o ‘ouro branco'

Voltar a plantar algodão no Seridó é um recomeço que traz toda uma memória afetiva aos agricultores que também viram seus pais e avós lidarem com essa atividade anos atrás.

Maria Azevedo de Brito, de 52 anos, trabalha com o esposo e envolve também outros membros da família, como os sogros no cultivo do algodão. “Eu cultivei algodão com meus pais e avós. Tivemos aqui muita falta de chuva…uns 15 anos de seca e não tinha como plantar porque também tinha o risco do Bicudo. Agora estamos voltando a colher”, contou a agricultora.

Ela planta um pouco de tudo no seu sítio, entre frutas, hortaliças, milho e feijão, além do algodão. Foram 1.209 quilos do “ouro branco” com caroço e 405,9 quilos descaroçado. “Ajudou bastante esse dinheiro que entrou. Consegui pagar um empréstimo que eu tinha feito. Se Deus quiser, vamos aumentar a produção”, contou.

Ela conta que antigamente as pessoas ficavam procurando onde vender e agora tem destino certo. “Além disso, tinha que produzir muito para ter algum lucro e o preço melhorou hoje em dia. Ano passado a gente teve um inverno bom e esse ano ajudou muito. O algodão que a gente cultiva agora não fica muito alto, é mais rápida a colheita”, avalia.

As chuvas também animaram a técnica agrícola Joana Dark Pires a acreditar na retomada da produção. “Choveu em janeiro e a gente plantou metade. Aí parou em fevereiro. As outras culturas não vingaram, mas em março voltou a chover e plantamos o restante”, disse ela.

Seus pais ambém plantavam no passado e neste ano ela pôde rever a alegria da mãe colhendo junto com ela. “Meu pai plantou até início da década de 1980. Foi quando o Bicudo veio e acabou com tudo. Meu pai já faleceu há 23 anos, minha mãe mora na propriedade e foi até colher o algodão comigo. Ficou muito satisfeita porque disse que quando criança o pai dela também produzia algodão em grande escala. Então é uma história familiar”, contou.

Para ela, o diferencial está acompanhamento técnico mensal desde o preparo do solo até a colheita e nas técnicas repassadas, tanto que ela soube aproveitar a oportunidade em outros cultivos. “Tenho um gadinho de leite e pensei que se nada produzisse, usaria para o gado. Então comercializei a fibra e o caroço ficou para o gado. O próprio talo do algodão e a folha eu fiz um pequeno silo poque quando a coisa piorar vou ter alimento moído para os animais”, explicou.

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