Como o Niger plantou 200 milhões de árvores

Niger plantou 200 milhões de árvores

Por séculos, florestas ricas pontilharam esta região poeirenta e ensolarada ao sul do Saara. Havia gordas alfarrobeiras africanas, arbustos delicados e bolsões esparsos de tamarindeiras e das suntuosas árvores Faidherbia albida, conhecidas localmente como gao.

Décadas de , desmatamento e demanda por lenha deixaram o Níger quase sem árvores. A intensiva para alimentar a população que mais cresce no mundo garantiu que novas árvores não criassem raízes. Os esforços do governo para reflorestar na década de 1970 falharam. Sessenta milhões de árvores foram plantadas; menos de 20% sobreviveram.

Em vez de cortar as árvores, os agricultores do Níger agora as deixam de pé e permitem que elas cresçam novamente a partir de tocos, sabendo que o solo ao seu redor reterá mais umidade e será fertilizado pelas folhas.

Nos últimos 35 anos, enquanto os cientistas imploravam às nações para que levassem a sério a revitalização das florestas, um dos países mais pobres da Terra, em uma das regiões mais duras do planeta, acrescentava de maneira espantosa 200 milhões de novas árvores – talvez mais.

Em pelo menos 4,8 milhões de hectares do Níger, as florestas foram restabelecidas com pouca ajuda externa, quase sem dinheiro, e sem expulsar as pessoas de suas terras. As árvores aqui não foram plantadas; elas foram encorajadas a voltar naturalmente, nutridas por milhares de agricultores.

Agora, árvores novas brotam de aldeia em aldeia. Como resultado, os solos estão mais férteis e úmidos, e o rendimento das colheitas está aumentando.

Os países vizinhos já estão correndo para seguir o exemplo. Mas especialistas dizem que outros continentes também deveriam olhar para o Níger como modelo. “É uma história realmente inspiradora”, diz Sarah Wilson, pesquisadora de pós-doutorado em florestas da Universidade de Victoria, no Canadá, que estudou o renascimento do Níger. “É o tipo de restauração que queremos. Apenas se espalhou de agricultor para agricultor.”

Histórico de desmatamento do

O Níger, do tamanho da Alemanha e da França juntas, atravessa o Sahel, a zona de transição entre o deserto do norte da e a floresta úmida que se estende do Atlântico, a oeste, ao Mar Vermelho, a leste.

O Saara circunda dois terços do país, mas o oeste, ao longo do fértil vale do rio Níger, e o sul, perto da fronteira com a Nigéria, sempre abrigaram grandes bolsões de árvores e arbustos.

Grande parte da população do Níger vivia nesta faixa arborizada. As árvores e arbustos forneciam sombra, mantinham água no solo e deixavam cair alimento para o gado. Os agricultores plantavam ao redor dos troncos, e quando podavam as árvores para lenha ou ocasionalmente as cortavam, as árvores rebrotavam rapidamente dos tocos.

Em Zinder, uma região do sudeste, uma espécie foi reverenciada: as Faidherbia albida, que durante a estação chuvosa deixa folhas que se decompõe nutrindo o solo com nitrogênio enquanto deixa entrar a luz do sol.

No início do século 20, agrônomos trazidos pelos governantes coloniais franceses instaram os agricultores a remover árvores – arrancar mudas e cortar tocos. O governo, buscando exportar amendoim, queria que o setor agrícola do Níger se preparasse para a exportação. Fez com que as fazendas passassem do cultivo manual para arados de aço puxados por animais.

Isso resultou em campos ordenados com linhas retas e sulcos perfeitos, que deixavam pouco espaço para as árvores. Muitos no Níger passaram a acreditar que árvores e plantações não deveriam se misturar.

Na segunda metade do século 20, a população do agora independente Níger explodiu. Uma série de secas severas no final da década de 1960 levou ao fracasso das colheitas e à fome.

Nascentes desapareceram. Poços secaram. Os agricultores continuaram derrubando mais árvores para a agricultura, mesmo quando os solos secavam ou perdiam nutrientes. Famílias desesperadas voltaram para o último bem da região: derrubaram as árvores restantes para vender nas cidades próximas como combustível para cozinhar. Mulheres e crianças caminhavam horas para encontrar madeira.

O Níger é um lugar difícil de cultivar qualquer coisa, mesmo quando há sombra; O Níger sem árvores é a própria caverna do dragão. As temperaturas atingem regularmente 37°C e chegam a 60°C na superfície do solo. Em meados da década de 1980, o país enfrentou um colapso ecológico. Mas dois eventos paralelos alterariam seu curso.

Como o Níger despertou para o plantio de novas árvores

Em 1983, um grupo de homens que viajou para o exterior em busca de trabalho durante a estação seca não retornou a tempo de retirar troncos e mudas de seus campos antes da estação chuvosa. Eles não tiveram escolha a não ser plantar ao redor deles.

Mas daí rapidamente notaram algo estranho. Culturas plantadas perto de árvores jovens pareciam crescer melhor e mais rápido. No ano seguinte, aconteceu novamente. Logo, outros fazendeiros pararam de limpar os campos.

As folhas caídas fertilizavam e mantinham o solo úmido. A vegetação bloqueava a entrada de areia do Saara e protegia as plantações do vento. “Foi como se todo o clima tivesse mudado”, lembra Maimouna Moussa, 60 anos, também de Dan Saga.

No segundo ano, ela já estava cortando e podando os caules dessas árvores que cresciam rapidamente, fornecendo lenha. Com o tempo, suas colheitas de milho dobraram.

Foi por volta dessa mesma época, no início dos anos 1980, a cerca de 80 km de distância, que Tony Rinaudo tropeçou em um toco.

Desde 1981, Rinaudo, um jovem missionário da Austrália, estava em Maradi tentando em vão plantar árvores. Ele sabia que elas esfriariam o ar emitindo umidade, forneceriam sombra e potencialmente ajudariam as plantações.

Mas plantar árvores era uma tarefa difícil, e as novas plantas na maioria das vezes morriam antes que suas raízes pudessem alcançar o lençol freático, que tinha dezenas de metros de profundidade. Os agricultores locais, enfrentando a crise, tinham pouco interesse em esperar anos para que as árvores jovens tivessem utilidade. “Eles estavam mais preocupados com o cultivo de alimentos”, diz Rinaudo.

Um dia, Rinaudo avistou um arbusto do deserto, um caule novo emergindo de um toco cortado. Eureka. “Eu já tinha observado árvores cortadas voltando a crescer antes”, diz ele. “Mas isso apenas esclareceu algo para mim – todos esses tocos podem se tornar árvores novamente.”

Rinaudo percebeu que sua abordagem estava errada. Ele não precisava de um orçamento e equipes de trabalho e inúmeras árvores jovens. Ele não precisava lutar contra o clima. Ele só precisava convencer os agricultores a confiar na natureza. Os humanos tinham que sair do caminho. “A verdadeira batalha era sobre como as pessoas pensavam sobre as árvores”, diz ele. “Tudo o que eles precisavam estava a seus pés.”

Nada nessa abordagem era novo. A chamada regeneração natural gerida pelo agricultor tem sido praticada em todo o mundo em sistemas de terras secas há séculos. Era essencialmente como os agricultores no Níger operavam antes do colonialismo.

Rinaudo buscou apenas popularizá-lo de novo e promovê-lo – convencer os agricultores a capitalizar as raízes profundas que seus ancestrais deixaram, literal e figurativamente, na terra.

Em 1983, ele começou a oferecer comida a um punhado de famílias em troca da disposição dessas famílias de experimentar – não plantando árvores, mas deixando-as crescer novamente, pelo menos seis por hectare de terra. Havia poucos interessados no início.

Os agricultores estavam céticos de que isso produziria mais alimentos. Deixar as árvores crescerem também era um convite para os ladrões, que as roubavam à noite para vender como lenha. Em 1984, muitos agricultores, frustrados, começaram a cortar suas próprias árvores novamente.

Não demorou muito, porém, antes que eles se arrependessem. Quase imediatamente, para os poucos agricultores que não cortaram, “os rendimentos das colheitas foram melhores”, lembra Rinaudo. Mandioca, batata-doce e gergelim cresceram melhor. Havia mais folhas, frutos e sementes comestíveis. Galhos caídos estavam sendo usados ​​para lenha; mulheres e crianças não precisavam mais se aventurar em busca de madeira.

Nos 12 anos seguintes, até o final da década de 1990, Rinaudo visitaria cerca de 100 aldeias, compartilhando o que sua primeira equipe experimentou. Voluntários do Corpo da Paz em Maradi fizeram o mesmo. Logo, os fazendeiros estavam conversando uns com os outros sobre isso.

Um movimento começou a tomar forma – um movimento que Dennis Garrity, ex-chefe do Centro de Agrossilvicultura Mundial em Nairóbi, no Quênia, agora considera “a transformação ambiental mais notável que posso imaginar na África”.

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